Akagatu e o Livro Vermelho



“Sr. Robson Albuquerque Ferreira Queiroz
Temos a honra de lhe comunicar que sua vaga na Academia de Magia e Bruxaria Magfia foi reservada e o Sr. deverá se apresentar na Estação Luz de Trem na Cidade de São Paulo no dia 1º de fevereiro ás 9:00 na Plataforma Especial que fica na ala norte na estação. Anexamos á esta a lista de materiais para o seu primeiro ano em Magfia e unimos á isso indicações para a compra das vestes para o uso interno e externo no colégio. Esperamos que tenha um ótimo ano letivo com muito aprendizado e conhecimento.
Chegou assim uma carta duas semanas depois do incidente nos jardins de Gadelha trazida por uma ave tropical colorida ao estilo comum de Magfia. Zacarias procurava sempre ser inovador sem perder o clássico, sua escola tivera sucesso porque ele implantou novidades trazidas da Europa, como o sistema competitivo de Casas, que havia no Centro Alemão Agaston, na Escola de Magia e Bruxaria Hogwarts na Grã-Betanha, na Instituição Mágica de Ensino Torre do Tombo em Portugal entre outras escolas reconhecidas e de alta excelência na comunidade mágica e porque ele implantara matérias brasileiras e sul-americanas que prestigiavam a magia do seu próprio país e dos países irmãos.
Essas duas semanas foram turbulentas para a família de Gadelha e para Zacarias, os dois foram responsabilizados pelos ataques contra a presidência e ainda o jornal A Voz do Bruxo era implacável contra o diretor, que tinha por dever, segundo o jornal, defender e previnir que o ataque fosse feito sem causar maiores danos e por outro lado a anfitriã deveria ter preparado a casa para possíveis ataques de bruxos das trevas, além disso por mais que quisessem responsabilizar Rodoberto Mourinho Salón pelos acontecimentos era improvável, “não, é impossível” reiterou o editor-chefe que ele tenha feito isso, primeiro porque ele é um dos maiores benfeitores da Nação tanto na área dos bruxos, os quais lhe devem alta gratidão por terem sido salvos da Peste Bruxa (um mal que se espalhou por volta da década de quarenta e que o jovem e brilhante bruxo Rodoberto eliminou com uma poção inovadora poderosíssima, dizem as más línguas que ele mesmo produzira o mal e o remediara para ganhar fama) e na área dos trouxas com auxílio ao governo não-mágico nos períodos de transição e tentando retomar a paz entre eles nesse período tão conturbado dos não-bruxos, ainda que pudesse ser ele, não havia meios, pois como se sabia ele estava em uma conferência mágica em Genebra, discutindo os rumos da sociedade bruxa com representantes do mundo inteiro. Semanas depois ficaria comprovado que eles estavam errados. Todos ficaram perplexos com as acusações feitas á tal bruxo e repudiaram-nas, a presidência retirou a comenda que havia sido dada á Academia Magfia e á Zacarias pelo brilhantismo demonstrado no meio educacional, e esta foi a primeira prova de que uma era terrível se iniciara, contudo a escola continuava com seu conteúdo programático e seguia a preparação para o início do ano letivo.
Em meio a essa turbulência Gadelha se preparava e preparava seu filho para o início das aulas, de forma que logo que a carta chegou ela a abriu em meio á refeição matinal na cozinha.
- Parabéns meu filho, tomara que você seja um bom aluno, mas logo lhe aviso, você não será tratado diferente dos outros alunos só porque seus pais são professores de lá. – disse a mãe com olhar severo.
- Mesmo assim não deixe de se sentir em casa meu filho, lá é um dos melhores lugares que eu conheço.- disse Wilson conciliador.
- De qualquer forma vejamos o que vem na lista de material.- disse Gadelha.
“ Livros Didáticos
Livro da Metamorfia do 1º Ano. – Clotilde Caronte
Compêndio Mágico Latino-americano de Magia Arcaica (Volume 1) – Miranda Verón
História da Magia (Volume 1: A Criação da Magia e os Povos Mágicos Pré-Históricos) – Roberto Brant
Conhecendo e Prevenindo o Mal – O Primeiro Passo – Geralda Mathias
Livro Fundamental de Poções – Poções Simples – Liando Metra
Livro de Encantamentos – O Início – Sara Maria
O Cosmos e a Terra – Jornada Inicial – Carlos Roberto de Sá
Descobrindo o Porvir – Serena Moliente.”

“Materiais Escolares
Um caldeirão simples de cobre, bronze ou latão
Uma varinha
Um cajado (para magias indígenas e nativas)
Um uniforme Magfia comum
Um uniforme de banho Magfia
Um traje sport Magfia”

“Os alunos poderão levar um animal de estimação: um rato, um sapo ou uma ave (de preferência da fauna nacional).”

- Como sempre o básico.- disse Gadelha despreocupadamente.- Semana que vem vamos ao Centro de Compras lá em São Paulo.
- Sim vamos, mas hoje temos uma reunião com a Sociedade, vamos querida.- disse Wilson. – Crianças fiquem comportados com a babá.
Assim se despediu das crianças deixando-as com uma velha muito velha, que tinha uma verruga na ponta do nariz, um chapéu tão velho quanto a pessoa que o usava, trazia uma vassoura a tiracolo, enfim, era a expressão mais conhecida de uma bruxa, “talvez seja por senhoras bruxas dessa estirpe que a classe toda fica desprestigiada” diria um colunista da Voz do Bruxo.

Enquanto isso em São Paulo a cidade agitava-se, o mundo trouxa era alarmado pela crise do golpe no governo trouxa, que já durava um tempo, e diziam novamente as más e algumas das boas línguas também que havia dedos de bruxos das trevas nessa situação toda. A Presidência Bruxa também ficou espantada, principalmente depois do ataque no Reveillon, este segundo alguns bruxos do alto escalão não seria um bom ano para a magia, tudo indicava isso. Via-se procissões e aglomerações públicas de profetas e videntes que diziam ser esse o final dos tempos no mundo bruxo, que por causa de toda a magia usada e proferida e por todas as maldades cometidas por eles, todos pagariam sem exceção. Muitas pessoas acreditaram nisso, algumas com muito fundamento. Artigos contra mal-olhado, para a sorte, para a melhoria dos poderes, para proteção eram vendidos á rodo pelo país todo e no exterior, o comércio lucrava com os tempos ruins que vinham.
Enquanto isso a Sociedade Mágica Magna Sofia recrutava secretamente em testes de alto grau de dificuldade novos membros para a defesa do mundo mágico da forma que ele era, reuniões eram realizadas sempre, e eles estavam tentando saber tudo que acontecia com o inimigo, tanto á nível nacional, quanto no resto do mundo. Percebia-se o movimento de grupos malignos em todos os locais, e numa análise mais ampla via-se quem liderava os atos asquerosos que aconteciam. Tudo era obra de Voldemort em sua sanha sangrenta pela morte de todos os sangues-ruins e pela supremacia de seu poder, os Comensais da Morte cresciam em número e em poder e Dumbledore se defendia da forma que era possível, e quase sempre se correspondia com Zacarias.
Ao mesmo tempo, os professores e Zacarias iniciavam os preparativos para o ano letivo que seria nesse ano muito turbulento, com a chegada dos novos alunos e a necessidade de se proteger a Academia Magfia a qual com certeza seria alvo da cobiça e da destruição de Rodoberto.

Gadelha foi com Robson ao Centro de Compras que ficava aos fundos do bar Cheiro de Alecrim que no início desse ano estava estranhamente vazio, parecia que pairava uma tensão modorrenta no lugar que obrigava a todos irem e virem logo e não se demorarem muito nem no bar nem nas lojas. Robson se impressionou com a variedade e a quantidade de coisas que existia nas lojas, ele nem reparou na estranheza que o lugar causava para a sua mãe. Gadelha comprou todos os materiais de Robson com muita facilidade e com uma rapidez espantadora, isso tanto pela falta de clientes nas lojas quanto pela presença de muitas pessoas estranhas e incomuns e vestes negras e olhares mal encarados. Robson ficou encantado com a vassoura do ano Clansweep 5, que tinha uma velocidade incrível e era a vassoura oficial da Seleção Brasileira. Enquanto Robson se maravilhava com os artigos esportivos, Gadelha comprou uma arara para o filho, era o que estava na moda atualmente, dava um ar vistoso e era muito bonita, multicolorida. Chegou perto do anoitecer em casa, viu a casa em perfeita ordem, as crianças sentadas no tapete brincando, Wilson ouvindo mais uma partida do Campeonato Brasileiro de Quadribol e seu time o Bebedouro Quidwich Club levava mais uma surra do seu maior adversário, o Bruxetos, que era de Barretos. Mas a paz permanecia fora do jogo na sala de estar.
- Que milagre é esse? – disse contente a mãe.
- Acho que eu me acertei com as crianças, finalmente. – disse também contente o pai, quando a campainha tocou.
- Ah, acho que é o Zacarias, eu convidei ele para jantar com a gente. – disse Gadelha e foi atender a porta. – Entre Zacarias, deixe-me guardar seu casaco e seu chapéu.
- Ah, obrigado Gadelha, como sempre muito educada. – falou Zacarias e entrou na sala. – Boa noite Wilson, Robson, Maria e Marcos. Como vocês estão?
- Muito bem Zacarias, e você? – enquanto Wilson perguntava, as crianças foram correndo de encontro do senhor novamente com a barba branca longa e abraçaram-no pedindo que ele fizesse alguma magia divertida.
- Muito bem também Wilson, mas deixe-me fazer uma magia interessante para seus filhos que eu aprendi a um tempo atrás. – disse com ar divertido Zacarias. – Á Akangatu!- e nesse momento apareceu um vaso com uma pequena semente plantada em terra que brotou rapidamente em uma única folha amarela. Marcos e Maria ficaram contentes e olhavam a planta com admiração e espanto. – Cuidem bem dela, ela vai crescer de acordo com o cuidado de vocês, irá acompanhá-los por muito tempo e quando vocês estiverem tristes ela terá o tom da tristeza, quando estiverem alegres como agora, ela ficará amarela brilhante, quando discordarem terá outra cor, sempre tendo o tom de acordo com o que vocês sentirem.
- Muito bem, deixe-me colocar essa planta na cozinha e venham jantar que já está pronto. – disse Gadelha tranqüilamente. – Sente-se, por favor sente-se Zacarias.
- Ah, obrigado Gadelha. – disse o diretor com um sorriso no rosto. – E então Robson, não gostou da planta? – falou isso ao ver que o garoto não dava tanta atenção á planta, mas sim ao criador dela.
- Gostei, mas... se o senhor me permite, como pôde criar algo do nada? Como pode ter esse poder? – disse curioso o garoto se sentando á mesa.
- Ah, sim, intrigante e óbvia essa pergunta, embora nós bruxos adultos já estejamos acostumados com as façanhas que podemos criar. Entenda Robson que cada um de nós seres vivos, e não digo somente nós bruxos. Todos os seres vivos, desde a menor aranha até o mais poderoso feiticeiro, temos o poder de criar, seja pela criação intelectual, pela emocional e com muita força de vontade podemos dar vida a determinadas coisas, mas antes e contudo não podemos esquecer o poder absoluto de Deus, pois mesmo que tenhamos a impressão de que criamos algo, ele mesmo já criou tudo que existe, de forma que podemos dar vida á coisas que antes não existiam ou eu deixaram de ter vida, não é assim quando algo está morrendo e você dá vida a ele? Então se você quiser pode fazer algo inanimado, ou seja, algo que não tinha vida voltar a ter. – explicou o professor.
- Mas eu posso tentar e não vou conseguir, eu ainda nem sei nada. – retorquiu o garoto.
- É claro que não, você é muito jovem, mesmo assim você pode criar outras coisas, e além disso você tem uma coisa que é importantíssima e que poucos de nós valorizamos, a curiosidade Robson, de qualquer forma ela é perigosa, mesmo que na maior parte das vezes construtiva. – disse o diretor.
- Agora já chega de perguntas por essa noite mocinho, você nem pegou no garfo, é melhor comer tudo antes que eu me estresse. – disse categoricamente a mãe. O jantar prosseguiu normalmente, sem mais perguntas curiosas, a conversa se direcionou para a guerra que se espalhava pelo país, mas antes a mãe pediu para que as saíssem da cozinha assim que terminaram o jantar. Os três, Gadelha, Wilson e Zacarias continuaram a conversa falando sobre os movimentos do inimigo, que já havia conseguido mais e mais partidários e que diziam alguns espiões ele pretendia direcionar seu ataque até Magfia em breve. Outras ações foram comentadas a portas fechadas enquanto as duas crianças mais novas se divertiam com a planta que ás vezes se movimentava estranhamente como se brigasse com eles e Robson foi para o seu quarto pensar um pouco e refletir, no final acabou dormindo.
Quando acordou na manhã seguinte sob os gritos e berros desesperados de sua mãe, o jovem Robson não se preocupou, nem se espantou, isso já era comum. O incomum era um livro que havia ao lado da sua cama na cômoda, um livro meio antigo e maltratado de uma capa vermelha intensa e que vinha com um bilhete em cima com uma caligrafia fina e rebuscada.
“Para você encontrar as respostas que sua curiosidade tanto busca...”
Ele estranhou, mas pegou o livro e levou-o para a sala onde a mãe enlouquecida arrumava seu material e a bagagem para o primeiro dia de aula.
- Mãe, que livro é esse? – disse o garoto ainda meio sonolento.
- Ah, é, o Zacarias te deu, dê-me o vou guardá-lo, depois você lê... – disse a mãe rapidamente e pegou o livro da mão do garoto. – Vá arrumar-se, vamos de flú, então é melhor ir rápido, antes que o trem saia.
- Sim, é claro. – disse num tom robótico e desanimado, causado pela separação do livro. Se arrumou rapidamente e desceu, tomou um café da manhã reforçado e acompanhou a mãe até a lareira, que como sabiam todos os bruxos brasileiros era uma dificuldade viajar por flú nesse país por não haver muitas lareiras, a não ser em casas muito antigas ou repartições governamentais. Sua mãe lançou o pó de flú na lareira e deixou as crianças novamente com a bruxa caquética que cuidava delas a anos, a casa ficou mais uma vez impregnada com o cheiro de alguma coisa antiquada e podre que lembrava peixe. Wilson já havia ido para Magfia mais cedo para se preparar para o início do ano letivo, Gadelha já estava atrasada e levou o filho até a Plataforma Especial da Estação da Luz em São Paulo, que assim como o padrão europeu em estações mágicas continha a famosa coluna de tijolos por onde se corria e atravessava chegando ao trem mágico, de forma que não foi difícil. Antes de ultrapassarem a barreira encontraram um casal muito jovem e uma menina muito bonita que tinha os olhos cor de jabuticaba e a pele negra de um tom muito bonito que tinha por volta dos dez anos olhando em volta procurando algo.
- O que procuram? – Gadelha disse num tom atencioso.
- Ah, sinto muito, mas a senhora não compreenderia... nós já perguntamos por toda essa estação e ninguém nos responde satisfatoriamente. – disse receoso o homem negro que acompanhava a criança.
- Entendo, os senhores procuram a Plataforma Especial, não é? – disse Gadelha.
- Sim, é o que procuramos, nossa filha precisa chegar a Magfia. – disse a mãe da criança de olhos jabuticaba.
- Ah, sim, basta atravessar correndo a barreira de tijolos e chega-se á plataforma. Vão na frente e nós acompanhamos vocês. – disse Gadelha prestativamente e os três correram para a coluna e a atravessaram tendo Robson e Gadelha em seguida a eles. Do outro lado encontraram os vagões de um enorme trem de uma plataforma imensa por onde percorriam dezenas de pessoas, era muito maior do que a Estação da Luz e o trem comportava centenas de pessoas. Eles foram juntos os pais deixaram a menina entrar, desejaram-lhe boa sorte e pediram que ela mandasse uma carta para eles assim que chegasse, Gadelha se despediu do filho indo para os vagões da frente. Robson e a garota seguiram juntos pelos vagões do trem e encontraram um vagão vazio no final do trem onde havia um outro garoto com cabelo em cuia e a pele meio avermelhada e uma garota sardenta que usava óculos e tinha os cabelos vermelhos como o fogo e encaracolados, ela estava recostada no banco da cabine, parecia dormir. O trem balançava levemente em quanto saía da paisagem urbana de São Paulo e prosseguia para o interior. Pediram licença e entraram.
- Oi, meu nome é Robson, qual é o nome de vocês?
- O meu é Susana. – disse a menina negra.
- O meu é Pedro. – disse o garoto com aspecto indígena.
- Eu, ãh, meu nome é Cláudia Encarnada. – disse meio sonolenta a garota ruiva.
- Porque esse nome? – disse Robson.
- Ah, é que da onde vieram meus pais encarnado é vermelho, e como você pode ver por todo o meu corpo eu tenho essas sardas e esse cabelo avermelhados. – disse Cláudia.
- Ah, sim. – disseram os outros três ao mesmo tempo.
- Como vocês souberam da escola? – perguntou Cláudia. – Eu recebi uma carta dizendo que eu era bruxa e que eu tinha uma vaga na Magfia.
- Meus pais são professores de lá, e eu recebi uma carta. – disse Robson.
- Ãh, eu não tenho certeza até agora, mas meus pais dizem que são bruxos e que eu também sou uma bruxa, na verdade eles estão preocupados que eu seja, eles achavam que eu era um aborto, sabe, acho que é porque eu sou um pouco desligada. – disse Cláudia meio desconcertada.
- Meu pai é descendente de índios feiticeiros e conheceu minha mãe que é trouxa aqui em São Paulo, recebemos uma carta em casa e eles me mandaram pra cá. – disse Pedro.
- Legal, vocês já sabem de qual casa vão ser? Se não me engano tem uns testes antes de chegar ao colégio, né? – inquiriu Cláudia.
- É, meus pais me disseram algo do tipo, mas eu não prestei muita atenção. – disse Robson.
- Meu Deus, e agora o que eu faço, eu não sei nada, nenhuma magia, não li nenhum livro, e agora? – disse uma desesperada Susana.
- Acho que é melhor não esquentar a cabeça com isso, talvez não seja tão difícil, é nosso primeiro ano. – disse calmamente Pedro. E enquanto a conversa prosseguia entre os quatro futuros amigos, Robson direcionava seu pensamento para o livro que estava em sua mochila, isso o inquietava. “Um livro que me dá respostas, como posso usá-lo?”. Pegou-o da mochila e mostrou aos outros três.
- Eu ganhei esse livro hoje cedo, na capa está escrito “Vade Mecum. Vide. Audi. Cogita. Erga sum.”, não sei o que significa, mas veio com um bilhete falando que ele me dá respostas, o que vocês acham? – disse Robson.
- Ah, abre, vê o que tem aí. – disse Cláudia.
- Concordo. – falou Pedro.
- Abre. – disse por fim Susana.
O garoto por fim abriu o livro e não havia nada escrito nele, mas mesmo assim havia algo estranho, algo que gerou uma inquietude em todos os presentes. Todos se aproximaram do livro absortos na luz que emanava do livro, mas intrigados pela ausência de qualquer coisa, a não ser aquele imperturbável silêncio que saia do livro.
- Alguém quer saber alguma coisa? – disse Robson. – É só perguntar.
- Acho que tem que pegar a varinha e apontar para o livro. Não é? – disse Susana.
- Então eu quero saber porque eu tenho a ver com o vermelho? – disse Cláudia apontando sua varinha para o livro.
- Você não tinha uma pergunta melhor? – perguntou Pedro.

- Era a melhor que eu ... – começou a dizer Cláudia, mas antes que ela pudesse terminar de responder eles foram absorvidos por uma enorme escuridão, que foi sugando toda a luz que havia em volta deles, aos poucos o trem foi sumindo, a paisagem campestre no lado de fora do vagão foi escurecendo e só sobrou a luz dos olhos das quatro crianças que olhavam descrentes do que viam. Na intensa falta de luz seus olhos somente distinguiam um ponto, um ponto vermelho que parecia sangue, que foi crescendo e crescendo, e uma certa claridade os envolveu e eles se afastaram do ponto vermelho que lhes revelou um rosto de uma garota jovem, por volta dos seus dez anos, que corria apressada atrás dos pais em uma rua apinhada de gente, ela era cheia de sardas e seu cabelo vermelho brilhava como fogo. Era Cláudia. Tudo em sua volta tinha cores vivas e ardentes como o vermelho que a caracterizava, no alto brilhava um sol radiante de fim de tarde que dava matizes também avermelhadas ao céu que entardecia, ela andava com extrema felicidade com seus pais. Foi então que como num filme, uma possante voz de um narrador vinda do nada começou a dizer:
“Cláudia, você que fez essa pergunta se preocupa porque a cor vermelha está tão inserida na sua vida, e eu lhe responderei. Garota, olhe a sua volta e veja as pessoas, o céu, a rua, as lojas e tudo que há, cada coisa é caracterizada por algo diferente, tudo tem características individuais e pessoais que nenhuma outra coisa por mais parecida que seja tem. Quando você pensa em algo, como uma maçã, o que lhe vem á mente? A cor vermelha não. Então se imagine como uma maçã, quando pensam em você se lembram da sua característica mais pessoal também. No caso de nós seres humanos e mais especificamente dos bruxos, podemos ver que aquilo que nos caracteriza está intimamente relacionado com nosso passado, presente e futuro. Saiba que isso é na vida de todos nós, nossas características definem grande parte do que somos, o vermelho é a sua característica.”
E enquanto essa voz que vinha de todos os lados falava, apareciam as mais diversas imagens, águas límpidas, céu azul, uma enorme maçã, pessoas com cabelos estranhos, roupas diferentes, ruas curvas, avenidas retas e subidas íngremes, tudo isso ilustrando a explicação da voz. As crianças se maravilhavam com o que viam e prestavam atenção no que acontecia de forma que estavam totalmente inseridas no que era mostrado, mas subitamente e rapidamente tudo acabou e eles se viram sentados novamente no vagão do trem olhando perplexos uns para o rosto do outro. Quase ao mesmo tempo em que eles voltaram do livro uma voz vinda de caixas acústicas do vagão dizia para se arrumarem, pois estavam chegando á Magfia. Eles olharam para a janela e viam que já estava anoitecendo, passaram horas no que tinha parecido minutos de explicação. Se arrumaram com o uniforme do colégio nas cabines que separavam meninas e meninos sem se falarem e depois retornaram ao vagão onde estavam antes.
- O que vocês acharam? – disse Robson de repente.
- Muito legal, mas era estranho. – disse Pedro.
- Me deu muitas respostas, mas eu tenho mais perguntas. – disse Cláudia.
- Foi a primeira vez que eu vi magia, e foi muito bom. – disse Susana. Os dois seguiram juntos depois que o sino soou e avisaram que haviam chegado. A partir daquele momento eles se tornariam os melhores amigos em todos os momentos.

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