Enfants

No dia em que minha mãe anunciou que esperava mais um bebê, meu pai reuniu todo o clã Black em um grande jantar festivo. Logo naquela noite começaram a chegar os presentes e mamãe era tratada como uma rainha, ainda melhor que de costume. Alguns meses depois, Elladora saberia que a criança que carregava em seu ventre era uma menina. Papai obviamente ficou um tanto decepcionado, afinal, já era a terceira garota e ele ainda não tinha seu varão. Mas essas nuvens logo se dissiparam e Alphond alegrou-se com a expectativa de ver a nova boneca, a terceira daquelas perfeitas e delicadas criaturas que adornavam a mansão. Ficou imaginando como a pequena seria. As duas outras haviam saído à ele, com cabelos escuros e feições fortes. Apesar do orgulho que tinha da família, desejou em seu íntimo que aquela saísse à mãe, de cabelos louros e traços suaves, denotando uma nobreza etérea e feminina, digna das deusas, bem diferente da dos Black, a nobreza dos reis guerreiros.
Logo que soube sobre o sexo da criança, Malfoy veio ter com meu pai. Tinha então um garoto que contava três primaveras de nome Lucius e a despeito da pouca idade, demonstrava surpreendente inteligência e auto-controle. Era um primor de educação e o queridinho da alta sociedade. Meu pai não cabia em si de felicidade quando prometeu casar-me com Lucius. A família Malfoy era de tradição e pureza indiscutíveis e, por ser o berço de vários políticos, tinha enorme influência no governo inglês.
A notícia do consórcio foi dada em uma elegante recepção e desde então os laços entre as duas famílias foram se estreitando, as visitas eram regulares e até os meus oito anos, eu e meu noivo mantivemos uma amizade um tanto fria, mas presente. Para mim, ele não passava de um garoto. Exatamente o que todas as garotinhas acham dos garotinhos antes da adolescência: Se eles não gostam de bonecas, então são simplesmente entediantes. Visitávamo-nos constantemente junto de nossas famílias para compartilharmos da hora do chá e, algumas vezes, passeios à cavalo.
Lúcio chegara aos onze anos com um corpo franzino e um ar passivo, quase mórbido. Os olhos azuis sempre parados e a face inexpressiva. Tinha modos cavalheirescos e se movia com elegância e vagar. Nessa época, estando eu com meus oito anos, achava-o ainda mais entediante e os olhares desdenhosos que dirigia à mim deixavam-me com os nervos à flor da pele, embora que tivesse que evitar, à todo custo, expressar esses instintos, afinal, eu era uma jovem dama da alta sociedade e deveria agir como tal. Essa impressão ficou em mim durante vários anos, acentuando-se ainda mais aos finais de ano letivo, quando ele sempre era cercado de mimos e elogios por suas notas exemplares em Hogwarts.
Quando chegou minha vez de entrar para a escola, fui mandada a Hogwarts, como já era de se esperar. Esforcei-me por seguir o exemplo de Malfoy. O que eu mais queria era ofuscar-lhe o insuportável brilho nas festas de fim de ano.
Lá, evitava relacionar-me com garotos, em uma primeira instância porque os achava inevitavelmente enfadonhos e, depois, porque havia sido ensinada que uma donzela sempre dava preferência às companhias do belo sexo. Não sentia necessidade de conversar nem mesmo com meu noivo - mesmo porque ele também não me dirigira a palavra em ocasião alguma, exceto para surreais bons-dias aos quais ele mesmo não ouvia. Minhas companhias usuais se limitavam à garotas de minha casa e idade, das quais tinha respeito garantido, devido ao nome que carregava. Não foi difícil conquistar a simpatia da direção da escola. Minha educação em casa fora esmerada, tivera uma tutora francesa que me preparara para a vida fora dos portões da mansão. Em suma, eu era uma preciosa boneca que chamava a atenção pelos modos delicados, o falar baixo, quase sussurrado, uma gramática perfeita nos lábios e uma fronte altiva que, porém, sabia a quem curvar-se.

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