Detenção

DETENÇÃO


O jantar foi um tanto quanto quieto. Ninguém dizia nada. Lily deixava os olhos no prato e James não se atrevia a olhá-la. Conhecia a menina muito bem, e sabia que aquela não era uma hora adequada para falar com ela. Não que visse motivos para ela ficar tão brava, afinal fora Parkinson quem dera em cima dele! As mulheres definitivamente eram muito complicadas. Estava pensando nisso quando alguém lhe deu uma cotovelada muito forte nas costelas. Lily levantou-se e, ainda sem olhar para ele, disse:


-Vamos pra detenção logo, Potter.


-Já falando comigo? -perguntou levantando-se sem pressa.


-Não tenho outra escolha, infelizmente -disse ela friamente -Temos uma detenção, e a culpa disso é toda sua.


-Minha? Não fui eu quem deixou uma menina com 5 centímetros de altura!


Nesse ponto Ron se intrometeu e disse:


-Agora ela está igual a uma boneca. Só no tamanho, é claro, porque as banhas continuam todas lá! Mas ainda estão tentando voltá-la ao normal!


-Eu nunca vou dizer o contra-feitiço. Nunca! -disse Lily sorrindo satisfeita.


-Lily, meu bem, adoraria conversar com você a noite inteira, mas temos uma detenção...Acho melhor irmos...


-Está certo, até mais -disse ela acenando para todos na mesa e seguindo James com passos lentos.


Os dois foram até a mesa dos professores, e Snape se levantou. Curiosamente não estava sorrindo, e logo os dois descobriram o porquê. Ele disse:


-Vocês dois vão cumprir uma detenção com a professora McGonagall. Ordens do diretor -acrescentou ele rispidamente. -Aparentemente eu não posso fazer isso, pois tenho questões pessoais envolvidas. Como se eu fosse fazer alguma coisa demais com vocês...Não guardo rancor nenhum...


-A gente finge que acredita, Seboso!


Lily pensou que se um olhar matasse James teria caído morto naquele momento. Snape não disse nada, apenas virou-se e voltou para a mesa. A professora McGonagall levantou-se e aproximou-se deles. Olhou-os por debaixo dos óculos e disse:


-Vocês terão que ajudar os elfos domésticos na arrumação da cozinha. E acreditem, isso não será fácil.


-Não se preocupe, professora, tenho certeza de que daremos conta -disse Lily seriamente enquanto James arquitetava vários métodos para levar comida escondido para a torre da Grifinória.


-Mas não é só isso. -disse ela tentando esconder um sorriso malicioso -O diretor achou que seria uma boa idéia para vocês dois aprenderem novas coisas...


-Como o que? -perguntou James.


-Você, por exemplo, Sr. Potter...Não está indo muito bem em História da Magia. Seria ótimo para o senhor ter umas aulas com a Srta. Potter, Evans! -disse ao ver o olhar furioso de Lily. -E a senhorita, por exemplo, não é muito boa em Quadribol, o que consideramos muito importante e relaxante para um bruxo, portanto você terá aulas com o Sr. Potter. -Lily revirou os olhos, pensando que provavelmente a professora nunca tinha montado numa vassoura. Antes que pudesse protestar, James disse:


-Eu acho uma ótima idéia, professora! Podemos começar amanhã?


-Mas é claro -disse ela ignorando o olhar de Lily e sua boca aberta -Agora vocês devem ir para a cozinha. Não creio que tenha necessidade de eu ir para lá. As instruções estão com o elfo Dobby. Vocês o reconhecerão pelas roupas um tanto quanto extravagantes...Bom trabalho, e até amanhã.


Quando os dois ficaram sozinhos Lily começou a reclamar. Disse que não tinha interesse nenhum em aprender Quadribol com ele, e que sinceramente não via utilidade nenhuma em sair arremessando bolas montada numa vassoura estúpida. Aquela declaração chocou James, que saiu marchando até a cozinha sem esperá-la. Ela achou aquilo uma tremenda falta de educação, mas ele realmente parecia bravo, o que a preocupou. Sacudiu os ombros e continuou andando, aquilo devia passar logo. James não ficava bravo com ela por mais de cinco minutos. Chegaram na cozinha e James logo foi até o canto direito, apontou a varinha pra um quadro da parede e murmurou algumas palavras. O quadro tremeu, mas não aconteceu mais nada. Lily pode ouvi-lo dizer “mas que desperdício...uma passagem tão boa...” Ela bufou. Um elfo aproximou-se deles muito empertigado, visivelmente animado com a importância de sua tarefa. Fez uma reverência exagerada enquanto os dois o examinavam de cima a baixo analisando cada peça de seu exótico vestuário. James quase riu, mas se controlou ao receber uma forte cotovelada nas costelas recém recuperadas depois da primeira batida de Lily. Ela o olhou com censura e tornou a olhar para o elfo que parecia ser Dobby. Ele começou por dizer que estava muito honrado em conhecê-los, já que eram pais do magnífico Harry Potter, o nobre, o valente, o honesto e o majestoso. Os dois se olharam divertidos. Aquele ser era muito engraçado! Depois de uns 20 minutos de introdução eles receberam as instruções. Deviam começar lavando todos os pratos de Hogwarts sem magia, depois ajudar os elfos a armazenar a comida e para terminar lavar o chão da cozinha. Os dois suspiraram, mas logo começaram a trabalhar. Estavam lavando a louça quando James disse:


-Então, Lily, é verdade que você não gosta de Quadribol?


-É sim. Não sei como você pode gostar de voar numa vassoura desconfortável enquanto seu cabelo se despenteia. Não que o seu precise ser despenteado -comentou ela levantando uma sobrancelha.


-Evans, Evans, Evans...Um dia você vai se render ao charme desse cabelo... -disse ele sorrindo.


-Na verdade, Potter, eu acho que não! -disse ela sorrindo de volta.


-Um sorriso! Já é alguma coisa! Lily, meu bem, ninguém resistiu a mim até hoje. E lamento lhe informar que você não será a primeira.


-Potter, a modéstia não é seu forte, não é mesmo?


-Bom, eu não tenho porque ser modesto, já que sou quase perfeito.


-Quase? -perguntou ela surpresa -Em que você não é perfeito?


-Responda você! Se eu fosse perfeito você ia ficar comigo, não? Mas então, me diga, em que eu não sou perfeito? -ele perguntou olhando-a de modo estranhamente sério.


Mas Lily não respondeu. Voltou a olhar para os pratos e sem querer, ao pegar um outro prato, derrubou espuma em James. Ele estava com a boca semi-aberta e acabou engolindo aquilo. Ele começou a cuspir no chão e Lily deu risada. Ele olhou para ela sorrindo e disse:


-Ei, não foi engraçado! -mas era óbvio que ele achava graça, e como ela não parou de rir ele pegou um punhado de espuma -É guerra? -jogou a espuma na cara dela, que na hora parou de rir e furiosa jogou mais espuma nele.


Assim começou uma guerra de espuma e os dois estavam muito brancos. Acabou com os dois no chão rindo ao ver a sujeira na qual a cozinha tinha se transformado. Os elfos tinham saído para cuidar de outras coisas e os deixaram sozinhos na cozinha. Agora eles tinham que arrumar tudo antes que chegassem de novo. James se levantou e deu a mão pra Lily, que aceitou a ajuda. Quando os dois estavam de pé James deu uma olhada geral pela cozinha e disse:


-Pelo menos é espuma de sabão! Deu uma limpada no chão! Já poupamos a terceira tarefa!


-Olhando por esse ângulo... -Ele estava olhando muito fixamente para ela, que desviou o olhar e virou-se para a pilha de pratos. -Só mais alguns e acabamos com os pratos. Acho que eu dou conta deles. Você pode secar o chão, e quando os elfos chegarem ajudamos a guardar a comida.


-Lily, eu...


-Acho que estou ouvindo passos! É melhor você se apressar! Olhe lá naquele canto -disse ela apontando um armário bem escondido -Deve ter panos e outras coisas pra te ajudar. -ele abriu a boca para falar alguma coisa, mas ela interrompeu de novo -Esse armário não é usado pelos elfos, já que eles usam magia...Por isso é tão escondido...


Ele pareceu entender o recado e foi andando até o armário, pegou um pano, se ajoelhou no chão e começou a limpeza. Depois de uma meia hora no mais completo silêncio Dobby chegou. Estava muito animado e fez dezenas de elogios ao trabalho dos dois, e Lily já estava se sentindo orgulhosa e começando a gostar do elfo quando ele disse que casais trabalhavam muito bem e eles não fugiam à regra. Ela cruzou os braços e fechou a cara. Não olhou para confirmar, mas tinha quase certeza de que James estava sorrindo. Aquilo a deixou muito irritada. Onde já se viu, pensar que ela tinha alguma coisa com JAMES! Aliás, James não! Potter! Ela nunca teria nada com Potter!! Se não tivesse visto Harry ainda não teria acreditado. Estava perdida nesses pensamentos quando alguém lhe deu uma cotovelada nas costelas. Ela olhou para o lado e viu James sorrindo:


-Vingança. Dobby já parou de falar. É pra gente ir até o depósito. Você ouviu alguma instrução depois que ele falou aquilo sobre a gente. -ela sacudiu a cabeça negativamente -Foi o que eu pensei. A gente vai até o depósito, onde o Dobby está agora. Vamos ter que organizar todos os ingredientes que eles usam para preparar a comida.


-Não parece difícil...


-Não mesmo! Vai ser até bom! Eles são muito prestativos, vão deixar a gente levar algumas coisas pra torre da Grifinória! -ela levantou as sobrancelhas e suspirou, mas ele pareceu não notar e continuou animado -Já falei com Dobby, ele disse que ficaria muito feliz em ajudar com tudo possível!


-Que ótimo, James! Mas acho que não é certo...


-Relaxe, Lily, eu já fiz isso várias vezes na nossa época...Ei! Não vai fazer nada, vai? Eu só te contei porque achei que você não faria nada! Eu confio em você, Lily. E, além disso, não é nada demais!


Ela ficou quieta. Ele confiava nela. Era isso que ele tinha dito, que confiava nela. Ela não podia fazer nada depois daquela declaração, podia? Não seria certo trair alguém que confia em você. E não era nada tão errado, afinal não havia sentido impedir os alunos de levarem comida da cozinha pras torres. Era comida, não dava pra fazer nada com comida. James não faria nada de errado com comida, faria? Mas será que ela confiava nele? E será que ele confiava mesmo nela? Ele podia muito bem ter falado aquilo pra amolecê-la. Ia se dirigindo lentamente até o tal depósito enquanto pensava. James estava um pouco na frente dela, e não parecia pensar em nada. Assobiava e olhava pra cima, totalmente despreocupado. Na verdade, pensando bem, ele nunca parecia preocupado com nada. Devia ser bom, ele sempre pensava nas provas e nas tarefas de monitora, nunca tinha tempo livre, estava sempre pensando em algo. E ele estava tão tranqüilo...Seus pensamentos foram interrompidos quando ela esbarrou nele, que tinha parado de andar.


-Ei, Evans, olha por onde anda! A gente já chegou!


Eles entraram num aposento muito grande. Então era lá onde eles guardavam a comida? Era um lugar enorme, lotado de todos os tipos de coisas necessárias para se preparar uma boa refeição. Centenas de elfos andavam pra lá e pra cá, levando pacotes em suas mãos e subindo em escadas para organizar tudo aquilo. O sistema era muito eficiente. Alguns elfos se aproximaram de James e lhe ofereceram muitas coisas. Ele aceitou tudo sorrindo, e agradecia enquanto colocava tudo no bolso. Quando tudo parecia cheio Lily achou que ele fosse parar com aquele abuso e fosse trabalhar, mas ele fez um feitiço que alargou todos os bolsos, e ele tornou a encher-se de comida. Ela revirou os olhos e o chamou.


-Vai dar uma festa, Potter?


-Faria um jantar romântico pra você, Lily, minha flor, mas como você não quer vou ficar com a festa mesmo!


-E quem disse que eu não quero? -perguntou ela sorrindo.


-Quer?? -perguntou ele ansioso.


-Não. -ela sorriu ainda mais e deu-lhe as costas.


Depois disso os dois não se falaram, a não ser sobre assuntos relacionados ao trabalho. Trabalharam por várias horas. McGonagall estava certa quando dissera que aquilo não seria nada fácil. Como os elfos trabalhavam! Além daquelas atividades noturnas tinham muitas outras durante o dia! Quando foram liberados foram direto à torre da Grifinória. O salão comunal estava vazio, devia ser bem tarde. Cada um se dirigiu ao seu dormitório. Quando Lily já estava praticamente na porta James falou:


-Boa noite, Lily, durma bem.


Ela parou por um momento. Conseguia senti-lo atrás dela. Ele estava parado olhando para ela. Respondeu:


-Boa noite, James.


Quando se deitou na cama, Lily percebeu que estava sem sono. Olhava para o teto enquanto pensava sem parar naquele sorriso que a perseguiu o dia inteiro. Expulsou o pensamento de sua cabeça, mas não conseguiu acabar com aquela frase que ecoava sem parar na sua cabeça: “Eu confio em você, Lily”.

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